domingo, 22 de setembro de 2013

Bento XVI e Santo Agostinho: escandalosos?

     Houve quem visse escândalo nas palavras de Papa Francisco sobre a salvação de ateus. Se não heréticas, no mínimo, ambíguas, decretou-se. Serão Santo Agostinho e Bento XVI também escandalosos? Segundo suas palavras, 'ateus devotos'* vão para o céu.
     A expressão 'atei devoti' é usada largamente na Itália e foi cunhada pelo jornalista italiano e diretor do jornal Il Foglio, Giuliano Ferrara, que se auto-intitula 'ateo devoto' (sem ser, como ele próprio explica, uma coisa nem outra :
"Sou um teísta racionalista e amo a devoção e a piedade religiosa, mas não pratico nem uma nem outra"). 

     O professor italiano de História das Doutrinas Políticas, Carlo Galli, definiu assim 'ateus devotos', em seu livro "ABC da Crônica Política": 'laicos que reconhecem que a razão moderna guarda estreito parentesco com o cristianismo e que buscam na Igreja Católica um reforço à identidade ocidental".


Primeiro, relembremos as palavras de Papa Francisco:

 

"Antes de mais nada, pergunta-me se o Deus dos cristãos perdoa a quem não acredita nem procura acreditar. Admitido como dado fundamental que a misericórdia de Deus não tem limites quando alguém se Lhe dirige com coração sincero e contrito, para quem não crê em Deus a questão está em obedecer à própria consciência: acontece o pecado, mesmo para aqueles que não têm fé, quando se vai contra a consciência. De facto, ouvir e obedecer a esta significa decidir-se diante do que é percebido como bem ou como mal; e é sobre esta decisão que se joga a bondade ou a maldade das nossas acções."

Abaixo, Bento XVI/Santo Agostinho:
 

"(...) Gostaríamos de nos confiar a santo Agostinho para uma ulterior meditação sobre o nosso Salmo.

Nela, o grande Padre da Igreja introduz uma nota surpreendente e de grande actualidade: ele sabe que entre os habitantes da Babilónia se encontram pessoas que se comprometem pela paz e pelo bem da comunidade, mesmo se não partilham a fé bíblica, isto é, se não conhecem a esperança da Cidade eterna pela qual nós aspiramos. Eles levam consigo uma centelha de desejo do desconhecido, do maior, do transcendente, de uma verdadeira redenção. E ele diz que também entre os perseguidores, entre os não-crentes, existem pessoas com esta centelha, com uma espécie de fé, de esperança, na medida que lhes é possível nas circunstâncias em que vivem. Com esta fé, também numa realidade desconhecida, eles estão realmente a caminho rumo à verdadeira Jerusalém, a Cristo.

E com esta abertura de esperança também para os babilónios como lhes chama Agostinho para os que não conhecem Cristo, nem sequer Deus, e contudo desejam o desconhecido, o eterno, ele adverte-nos também a nós que não nos fixemos simplesmente nas coisas materiais do momento presente, mas que perseveremos no caminho para Deus. Só com esta esperança maior podemos também, do modo justo, transformar este mundo. Santo Agostinho diz isto com as seguintes palavras: "Se somos cidadãos de Jerusalém... e devemos viver nesta terra, na confusão do mundo presente, na actual Babilónia, onde não habitamos como cidadãos mas somos presos, é preciso que quanto foi dito pelo Salmo não só o cantemos mas vivamos: o que se faz com uma aspiração profunda do coração, plena e religiosamente desejoso da cidade eterna".

E acrescenta em relação à "cidade terrestre, chamada Babilónia": ela "tem pessoas que, movidas pelo amor por ela, se esforçam para garantir a paz temporal sem alimentar no coração outra esperança, aliás repondo nisto toda a sua alegria, sem se promover outra coisa. E nós vemo-los fazer todos os esforços para se tornarem úteis à sociedade terrena. Mas, se se esforçam com consciência pura nestas tarefas, Deus não permitirá que pereçam com Babilónia, tendo-os predestinado para serem cidadãos de Jerusalém: mas contanto que, vivendo na Babilónia, não tenham a ambição da soberba, a pompa caduca e a arrogância irritante... Ele vê a sua disponibilidade e mostrar-lhes-á a outra cidade, pela qual devem verdadeiramente suspirar e orientar todos os esforços" (Exposições sobre os Salmos, 136, 1-2; Nova Biblioteca Agostiniana, XXVIII, Roma 1977, pp. 397.399).

E pedimos ao Senhor que desperte em todos nós este desejo, esta abertura a Deus, e que também os que não conhecem Deus, e os que não conhecem Cristo possam ser tocados pelo seu amor, para que todos juntos nos coloquemos em peregrinação para a Cidade definitiva e a luz desta Cidade possa surgir também neste nosso tempo e no nosso mundo."
http://www.vatican.va/holy_father/benedict_xvi/audiences/2005/documents/hf_ben-xvi_aud_20051130_po.html

*Ateus devotos: http://www.ilfoglio.it/soloqui/14802

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Rad-Trad, lê o artigo abaixo. Não tem confusão alguma. É o que escrevi.
      http://blogdemirianmacedo.blogspot.com.br/2013/09/o-que-e-consciencia-para-um-catolico.html

      Excluir