quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Brasília, o que foi feito de ti?


    Capital da Esperança, Brasília era linda, só não podia envelhecer. Na década de 70, na frescor de seus  quinze anos, a cidade transpirava graça e beleza: a tinta nova dos prédios e casas, o gramado estendendo-se como tapetes bem cuidados por quilômetros na cidade, as superquadras floridas e arborizadas, sem guaritas nem portarias, os (poucos) carros, o trânsito ameno, a imensidão da Esplanada, os edifícios e palácios de Oscar Niemeyer que pareciam flutuar, as estruturas de concreto sem mofo nem bolor, tudo isto, fazendo contraste com o mais belo céu e por-do-sol do planeta, encantava o coração e fazia esquecer suas mazelas. 

   Brasília foi construída na linha reta do horizonte, nada limitava nosso olhos. Cidade sem gente? E nós, éramos o quê? Caminhar por passagens subterrâneas? Que bobagem. A idéia de prédios de seis andares, sobre pilotis, era para preservar a visão do céu e das estrelas e permitir que todo mundo - qualquer cidadão - andasse por dentro das quadras, sem necessidade de se desviar. Não havia cerca, muro, nada. Os prédios não tinham sequer porteiro. O acesso aos apartamentos era feito por uma por
ta de vidro e um hall de elevador. 

   Em Brasília, costumávamos andar pelos gramados do Plano-Piloto à noite, à luz da lua, sem perigo, sem sobressalto. Brasília era a única cidade onde não era proibido pisar na grama. Quem tinha nascido lá, ou viera muito jovem para Brasília, não se acostumava com as outras cidades, tão convencionais e velhas. 

   Vivi em Brasília de 64 a 80, dos 11 aos 27 anos. Minha adolescência e juventude. Como toda (c)idade, tinha suas dores e alegrias. Hoje, mais de 30 anos depois que eu saí de lá, não reconheço mais Brasília. 

    Concordo com uma amiga , Ana Prudente, que escreveu: "Brasília pretendia ser uma coisa e, então, deu tudo errado e ela se transformou em algo inominável". Vendo a cidade como ela é hoje, comentei no álbum de fotografias de Brasília, feitas por Clara Favilla, uma querida amiga que ainda mora lá:

   "Ao assistir ao documentário 'Why beauty matters', produzido pela BBC e apresentado pelo filósofo Roger Scruton, lembrei-me imediatamente de Brasília e sua arquitetura. Não resisti: a cidade parece destinada à implosão. Vendo tuas fotos sobre estas quadras brazilienses, constato um fato inescapável:

 " Nosso mundo virou as costas para a beleza. Não somente a arte fez um culto à feiúra, como a arquitetura tornou-se sem alma e estéril. Não foi somente nosso entorno que tornou-se feio. Nossa linguagem, música e maneiras se tornaram mais rudes, ofensivas, como se a beleza e o bom-gosto não tivessem lugar em nossas vidas." Roger Scruton diz tudo.


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