sábado, 29 de agosto de 2015

Honestino Guimarães e a (falta de ) democracia


      
     Meu compromisso é com a verdade, eu não discuto com a realidade, eu a aceito assim como ela se me apresenta. As coisas são como são.      
     Se Honestino Guimarães é herói de tantos que o cultuam como 'o mártir que a ditadura militar assassinou', nada tenho a ver com escolhas pessoais. O meu assunto é outro. Eu estou interessada na verdade. A ditadura o matou, mas Honestino não deu sua vida pela democracia.

     Vou contar uma experiência pessoal, com a ressalva de que eu era uma 'inocente inútil', sem qualquer importância como quadro revolucionário. 
      
     Eu caí em junho de 1973, numa operação-arrastão em que foram presos 33 alunos da Universidade de Brasília.(Soubemos que foram presas 150 pessoas no total, a operação não se limitou à universidade). Isto foi pouco antes da prisão de Honestino Guimarães (ele foi visto pela última vez, em setembro daquele ano.
      

     Eu fazia parte de uma célula - vim a saber com mais detalhes tempos depois - do PC do B/AP-ML (Ação Popular Marxista Leninista), a mesma organização de Honestino Guimarães, que eu não conheci pessoalmente.  Na época, estas organizações enfrentavam o Exército Brasileiro, na Guerrilha do Araguaia. Na verdade, quando fui presa, eu nem sabia direito a que eu estava ligada, o segredo fazia parte das normas da casa. Se alguém caíssse...
      
    Ainda assim, cheguei a participar de reunião secreta, cercada de rigorosas normas de segurança: trocar de táxi várias vezes, não pronunciar o próprio nome, nem dos outros conhecidos presentes, estas coisas. Lembro-me que eu não contava nem para o namorado ou gente da família o que fazia nem aonde ia.
   

      As análises do 'momento histórico', nestas reuniões de doutrinação de que eu participei, tinham enfoque nitidamente revolucionário. A proposta era de destruição do Estado burguês capitalista, instalação da ditadura do proletariado/campesinato (a APML era maoísta) e nenhuma negociação com a velha ordem burguesa.
     
     Usar os instrumentos da democracia, como eleições, liberdade de imprensa, aparato jurídico, habeas corpus etc - para permitir e acelerar a tomada do poder para a implantação do comunismo - era um dever do militante revolucionário. 
      
     Marx e Lênin nos explicavam que 'liberdades democráticas' eram apenas instrumentos da burguesia para oprimir o verdadeiro sujeito da História: o povo trabalhador.
      

     A instalação de uma ditadura comunista era a proposta de todos os grupos de luta armada no Brasil, àquela altura. E também de grande parte da esquerda não engajada diretamente nas organizações. Admitamos e confessemos:todos nós sonhávamos com o comunismo. 
       
     A fórmula era (e ainda é) esta: a vanguarda revolucionária luta para tomar o poder, que será concentrado em suas mãos para que ela faça as modificações que achar necessárias à transformação radical da vida humana e do mundo.
  
     E, por lutar para concretizar tão nobre (e hipótetico) futuro, o revolucionário está acima de qualquer julgamento da espécie humana. No final, a História o absolverá.
     
      Esta é a essência da mentalidade revolucionária até hoje. Esta é a verdadeiro ideologia que a organização a que pertencia Honestino Guimarães professava. Não sou eu que quer assim. É assim, foi assim. Honestino Guimarães falava em democracia apenas como cortina de fumaça para seus verdadeiros objetivos. Era um instrumento na luta  para se implantar a ditadura comunista.
     
      As provas documentais de que esta é a verdade estão à disposição de quantos queiram conhecê-la(s). Existem dezenas de páginas só de fontes primárias sobre o assunto. 
      
     Se Honestino Guimarães é herói de tantos que o cultuam como 'o mártir que a ditadura militar assassinou', nada tenho a ver com escolhas pessoais. O meu assunto é outro. Eu estou interessada na verdade. A ditadura o matou, mas Honestino não deu sua vida pela democracia.
      

     À parte isto, eu repito: é inegociável a condenação incondicional da tortura, da violência e do desrespeito aos direitos humanos de militantes da esquerda. O Estado não pode torturar, matar e desaparecer com um único cidadão.

2 comentários:

  1. Miriam, análise /depoimento irretocável. Vale relembrar, uma vez mais, que recentemente o Fernando Gabeira fez de público essa autocrítica em relação ao viés nada democrático dessa esquerda que agora chegou ao poder no Brasil. Sempre procurei destacar os cacoetes autoritários da esquerda que muito a assemelham ao regime militar de outrora: o gosto por slogans grandiloquentes; o enorme apreço por obras faraônicas; o descaso olímpico pelas questões ambientais são alguns desses traços em comum. A distingui-los, no fundo, é que os militares não nos legaram tanta roubalheira e corrupção.

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  2. Sou testemunha também como militante da resistência à ditadura militar e concordo plenamente . Não havia santos na guerra contra os militares golpista ( alias minoria como se sabe ) .

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