quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

A volta para Casa

      Criei coragem e vou contar como foi a minha volta para a Casa do Pai, depois de quase quarenta anos distante de Deus. Na verdade, eu já tinha pensado em escrever relatando a minha conversão. Depois, desisti. Achei acesso - ou excesso - de vaidade, jornalista gosta de contar a história dos outros. Mas ao ler outros relatos, comoventes, considerei avareza não repartir a minha história.

    Peço generosidade e compreensão pelo meu desajeito no trato dos assuntos de Deus. Tantos anos sem rezar fez com que o coração desaprendesse a delicadeza e a reverência necessárias quando falamos das coisas "do alto". O cérebro, então, mais frio e prático, só vai aprender a ser doce com o tempo.


    Mas não posso falar mal da razão: foi também ela que devolveu-me à fé. Eu sou assim, preciso compreender, sem lacunas, "redondo", como se diz no jargão jornalístico. Só seduzem-me e convencem as grandes elaborações, os pensamentos sofisticados. O Mestre ordenou: "Ide e ensinai". Eu confesso: sou aprendiz.

    Comecei a fugir da Igreja, devagarinho, quando tinha 14 ou 15 anos. Em casa, meu pai, afastado da Igreja, nada falou. Minha mãe, católica praticante, não gostou, mas não admoestou; depois, se conformou. Menina inteligente, estudiosa, longe de ser rebelde sem causa, cometi esta rebeldia porque era moderno. No final dos anos 60 e início dos 70, o mundo estava de cabeça para baixo. 
    
    Eu morava em Brasília, e de lá assisti a guerra do Vietnã, festival de Woodstock, maio de 68 na França, morte de Guevara, Beatles, AI-5, primavera de Praga, Tropicália, festivais. Neste admirável mundo novo, soava velha esta história de Deus e pecado. Religião só se fosse a de Dom Hélder Câmara. Abaixo as carolas marchadeiras!

    Em 72, eu passei no vestibular para jornalismo na Universidade de Brasília; em julho daquele mesmo ano, saí de casa para morar numa república de estudantes. O ambiente da universidade era muito politizado, éramos todos comunistas. Tanto é que, em junho de 73, passei 11 dias no DOI-CODI, entre capuz na cabeça, interrogatórios intermináveis, ameaça (não consumada) de choque elétrico, muito medo e pouco heroísmo. 
    
    Quando saí, como boa comunista, menti e exagerei, recheando o relato da experiência com palavras fortes - 'gritos assombrosos', 'noites aterrorizantes', 'tortura desumana'. Tudo lorota.

     Depois que saí da cana é que eu soube o que eu era e onde eu estava metida: era militante e integrava uma célula da Ação Popular Marxista-Leninista do PC do B, linha maoísta, o mesmo pessoal que fazia a Guerrilha do Araguaia, a turma de José Genoíno e de Honestino Guimarães, da UNE. 
     
     Eu tinha quase 20 anos e já estava incumbida de trabalho de aliciamento e conscientização em áreas operárias na periferia de Brasília. Faltou pouco para eu 'cair' fazendo um trabalho deste. As pessoas que me aliciaram e dirigiam a célula a que eu pertencia eram 'putas velhas', como jornalistas se referem aos mais velhos e experientes da profissão. Eles sabiam que eu era 'inocente útil', que eu não tinha a menor idéia do perigo que corria. Ormai, ero carne bruciata.
     
     Naquela época, Marx explicava tudo: as razões da opressão e o caminho para a libertação. E lá ia eu, vigiada pelos "ômi", assistir às palestras de Dom Pedro Casaldáliga e Dom Tomás Balduíno. A religião era o ópio do povo, mas aqueles eram padres dos bons. Não porque eram padres, mas porque eram comunistas, graças a Deus!

    Mas nem só de pão vive o homem. Eu queria também Paz e Amor. Amor livre, claro. Para libertar nossos corpos e nossas mentes, a fórmula era conhecida: sexo, droga, rock'n roll e outros ritmos musicais alternados ou simultâneos.

    Tínhamos quase tudo: o som, o fuzil e a maconha. Mas faltava o algo mais, a espiritualidade. E, assim, num fiat lux cósmico, o raio da Nova Era iluminou a nossa existência. E foi um sem-fim de yin, yang, ioga, prana, sutra, maia e karma.


    O cardápio podia variar, mas era sempre uma combinação de certos ingredientes: um prato de arroz integral com gergelim, um baseado, sair para dançar, ir para cama com mais um ou qualquer um e cumprir o dever revolucionário de derrubar o governo.

    Quando me senti no fundo do poço e tudo ia mal - trabalho, convivência com a família, saúde etc  - eu disse 'basta, vou mudar'. Mudei. Parei de beber, de fazer sexo, recolhi-me. Mas, no lugar de voltar para Deus, fui para o analista. Da parte espiritual cuidava a macrobiótica, a que me submeti rigorosamente por sete anos. 
    
    A macrô era suficiente para dar-me Discernimento Superior e harmonizar-me com a Ordem da Natureza e ainda trazia a vantagem de reforçar a análise dialética e materialista da realidade: afinal yin-yang podia ser traduzido como capital-trabalho ou burguesia-proletariado. Perfeito!

    Eu estava com 27 anos quando, no carnaval de 1981, reencontrei em São Paulo um jovem engenheiro paulista (ex-católico, como eu) com quem eu tinha tido um "flerte" tempos antes. Neste reencontro, nós decidimos, em cinco dias, nos casar, completamente apaixonados. Transferí-me de Brasília para São Paulo e passamos a viver juntos. Sem papel e sem padre. Era um casamento moderno, baseado no princípio do prazer e na superação de resquícios da moral pequeno-burguesa.

    Como natureba, meu método de controle de natalidade era tabela e período de fertilidade. Falhou, claro, porque o desejo era maior que a preocupação com uma possível gravidez. Para mim, gravidez recente
 se resumia a um conjunto de células indiferenciadas, sem consciência ou personalidade. A ciência nos garantia isto.

     E mais: aquela não era a hora de ser mãe, eu achava que nosso relacionamento estava começando e nós podíamos ainda nos divertir muito antes de pensar em filhos. E, afinal, eu era dona do meu corpo e 'nossos corpos nos pertenciam', era o lema da liber(t)ação feminista. E foi com esta mesma forma de encarar os fatos que eu resolvi a minha segunda gravidez (que Deus me perdoe)
    
    Na terceira gravidez, resolvemos assumir e nos casamos, só no civil. Quando meu filho nasceu, troquei as laudas pelas fraldas. Para cuidar dele, larguei uma glamurosa e promissora carreira de jornalista que eu havia retomado em São Paulo com brilhantismo, depois de ter saído daquele fundo de poço e me casado. 
    
    Mas Deus continuava fora. Tanto é que não batizei meu filho. A mesma decisão foi mantida com as minhas duas filhas. Diante da insistência da minha mãe, pedi que ela mesma os batizasse. Quando tinha quatro anos, meu filho me perguntou quem era Deus. Respondi-lhe: "É o chefe do Bem".
    

    Eu penso que acabei de certa maneira criando meus filhos no espírito de que falou João Paulo II. Eu não acreditava em Deus mas vivia (quase) como se Ele existisse. Só que, em vez de religião, ética. 
    
    A crítica era à Igreja, e a visão era marxista: "ópio do povo, instrumento de opressão das classes favorecidas, ideologia mantenedora dos privilégios de classe, aliada do capital na escravização do povo" e outros blá blá blás.

    Como me distanciei da Igreja ainda adolescente, fui aos poucos desaprendendo o que sabia da vida de Jesus Cristo e da doutrina da Igreja Católica. A ponte mais próxima com a religião era a minha mãe, mas eu não encontrava nela qualquer desafio às minhas heresias e incredulidades. 

    
    (Apesar de crer incondicionalmente, minha mãe não se interessa muito em conhecer mais profundamente a doutrina cristã, diz que a Seicho-no-iê a tornou melhor católica, gosta da Igreja "alegre e moderna" e das 'missas cheias de graça' e acha que padre pop star presta serviço a Deus).

    E para meu azar,  a religião desandou numa breguice só quando neo-evangélicos, adeptos da Teologia da Prosperidade, infestaram o mundo e a televisão com aquela enxurrada de gente dando testemunho de que tinha aceitado Jesus no coração. Onde quer que eu pusesse os olhos, lá estavam as frases "Cristo salva", "Deus é fiel" e "Jesus te ama".

    O pior é que Igreja Católica, que sempre foi um reduto de decência, achou de se modernizar com o surgimento da Renovação Carismática e começou a trocar os slogans revolucionários da Teologia da Libertação - do prisioneiro político Jesus de Nazaré dos freis Boffs e  Bettos - pelos apelos do "Deus é 10 e o CD é 15".

    Quanto ao Papa Woytila, eu valorizava a sua ação política em favor dos pobres, mas achava-o retrógrado e cheio de moralismos antigos, principalmente nas questões sexuais. Já que a religião andava assim, eu preferia continuar sem transcendências, mas -  pelo menos - com um pouco de elegância e sofisticação intelectuais.

    E logo descobri o que havia de mais avançado no pensamento de esquerda no mundo: o grupo marxista alemão Krisis, liderado pelo ensaísta Robert Kurz. Este grupo, herdeiro da Escola de Frankfurt e adepto da Teoria Crítica, fundamenta a sua análise nos conceitos de forma-mercadoria e trabalho abstrato. 
    
    O pulo do gato, entretanto, era outro: ao fazer a crítica radical do sistema mundial produtor de mercadorias, Kurz e seus discípulos conseguiram realizar um verdadeiro milagre: provar que Marx estava errado e certo ao mesmo tempo!  
    
    Segundo Krisis, já não era a luta de classes que movia a História, como pregava o Marx jovem, mas as relações fetichistas, como concluía o Marx velho. Isto é que era revolução. Marx está morto, viva Marx!

    Os novos críticos apontavam o defeito iluminista de Marx em crer que a Razão faria surgir o Homem Novo. Em vez disso, o homem se tornara cada vez mais alienado, egoísta e violento, mesmo quando melhoravam as condições materiais objetivas de sua existência. Estavam aí os Estados Unidos que não os deixavam mentir.  
    
    Logo - concluíam os marxistas anti-marxistas - a solução dos problemas da humanidade teria de passar pela superação do próprio Iluminismo e sua racionalidade; de fato, o capitalismo é a mais exemplar expressão da racionalidade, o que mais se fala no capitalismo é de racionalização.

    A saída: mudar a Razão Pura em Razão Sensível, seja lá o que isto for. Como fazer a mudança, o grupo Krisis até hoje não descobriu. Ou seja: ninguém sabe.

     O meu desencanto com o marxismo foi acontecendo naturalmente. Um dia, lendo um texto do filósofo, historiador e cientista político alemão radicado nos Estados Unidos, Eric Voegelin, convenci-me de que o marxismo carecia completamente de fundamentação filosófica que o sustentasse. 


    Esta certeza se consolidou com a leitura de análises sobre a obra de Marx, principalmente a Teoria da Mais-Valia, feitas pelo economista austríaco e Ministro das Finanças, Eugen Bohm-Bawerk, no final do sec. XIX.
   

    Depois, era só ver em que tinha dado o tal do "mundo comunista". Sempre me martelava na cabeça a observação do jornalista Paulo Francis de que a Revolução Russa não podia mesmo ter dado certo. Afinal, tinha começado matando crianças - os filhos do Czar Nicolai.   

     Engraçado é que nada me fazia imaginar que eu já estava trilhando o caminho de volta a Deus. Certo dia, me caiu nas mãos um livro de um "erudito" judeu, chamado Zecharia Sitchin, que se apresentava como expert em arqueologia, História e línguas antigas (hebraico, sumério, acádio etc). Ele afirmava que as tábuas de argila encontradas na Mesopotâmia, há seis mil anos, não eram mitos, mas relatos factuais da vinda de extraterrestres de um planeta de nome Nibiru.

    Estes ETs, chamados de anunakis pelos sumérios, eram os Nefilim da Bíblia. A tradução de "caídos" era errônea: Nefilim queria dizer "os que desceram do Céu para a Terra" ou, mais precisamente, "os homens dos foguetes ou das naves espaciais". Eles teriam colonizado a Terra há 500 mil  anos, criado o Homem por manipulação genética. 
    
    A palavra Elohim, escrita no plural no Gênesis, provava que Deus eram "deuses. Estes, depois de criarem o homem pela fecundação de um óvulo de mulher-macaco e o sêmem de um "deus" anunaki, deram a civilização à raça humana. Voltariam nos próximos anos, completando mais uma órbita de 3600 anos em volta do Sol.

    A teoria era absolutamente ousada e desconcertante. Sitchin sugeria que uma Onipotência Universal poderia até existir, mas os que vieram à Terra foram chamados Deus e Anjos equivocadamente. Quem falou a Abraão e a Moisés foram estes viajantes de naves espaciais vindos de Nibiru. 
    
    Eu pensava comigo: 'então, eu posso estar certa e a religião errada; o que nós chamamos de Deus pode ser apenas um extraterrestre'. Resumindo: não havia nem metafísica nem transcendência.

    Não que histórias de ETs me arrebatassem, mas - caramba - eu também tinha lido o livro "Eram os Deuses Astronautas" na adolescência! As evidências intrigantes, as "qualificações" do autor - que incluíam até a de consultor da Nasa - e as numerosas citações de fontes acadêmicas reconhecidas (Samuel Noah Kramer, para citar só um) acabaram  levando-me a ler todos os livros de Sitchin, além de muitos outros sobre pré-história, Mesopotâmia, sumérios, babilônios, assírios, caldeus, egípcios, mitologia grega e hindu, religiões antigas etc etc.
    

    Aproveitei esta história de ET e anunaki para ler ainda, sem qualquer critério, tudo o que encontrei na Internet sobre ufologia, esoterismo, Fraternidade Branca, espiritismo, religiões orientais, calendário maia, teosofia e um sem-fim de assuntos místicos e esotéricos.

    Não foi difícil, com o volume de informação que reuni, refutar completamente a teoria maluca dos anunakis. Não tinha sido, afinal, perda de tempo, pois aprendi muito. E mais: trechos do Antigo Testamento, citados por Sitchin, começaram a me fazer pensar. Eu jamais tinha lido a Bíblia e passei a me interessar e ler sobre assunto.

    Foi, então, que um amigo emprestou-me um livro de Rudolf Steiner, de quem eu sabia apenas que era o criador das escolas Waldorf e da Antroposofia. Lembro-me que, à época, o Papa João Paulo II já estava muito doente e falava-se abertamente que ele não duraria muito. 
    
    Eu, de minha parte, mantinha o espírito crítico de velha marxista e teimava em ver a Igreja e o Papa sob o ângulo político, apontando o interesse da instituição em tirar proveito daquele martírio, transformando-o num espetáculo midiático.

    Como eu nunca tinha lido qualquer livro de Antroposofia, estranhei a observação deste amigo de que, para Steiner, o caminho era o Cristo. Era verdade, o autor mostrava Jesus Cristo como a maior dimensão de amor que se podia imaginar.


    Steiner considerava o Cristo como alguém absolutamente fundamental para a evolução espiritual do homem, o próprio Deus encarnado. Espantava-me a minha igorância sobre este Ser tão inigualável e me perguntava como é que eu nada sabia sobre Ele. E fui devorando os livros de Steiner.

     Para explicar a encarnação de Jesus Cristo, Steiner monta uma sofisticadíssima teoria que remonta à Atlântida, passa por Zaratustra, faz conexão com Hermes no Egito, engloba Moisés, Abrãao, essênios, budismo, Krishna , dois Jesus, duas Marias, dois Josés até chegar ao Mistério do Gólgota. De quebra, faz uma leitura dos Evangelhos como o mais puro e pedagógico manual de iniciação. 
    
     Ou seja: a Palavra de Deus não é mais que sabedoria oculta. Miraculosamente, cada palavra dos Evangelhos corresponde a um símbolo com significado na escrita esotérica e na sabedoria dos mistérios. Para entender Steiner, comprei a Bíblia de Jerusalém e, pela primeira vez, li os quatro Evangelhos e o Apocalipse. Steiner escreveu um livro intitulado O Quinto Evangelho (sic).

    Mesmo sendo muito fabuloso e surpreendente, Steiner parecia consistente, lógico, sofisticado e verdadeiro. Cheguei até a pensar - na minha ignorância e que Deus me perdoe - que a Igreja Católica sabia de tudo, mas não o podia revelar, pois ainda não tinha chegado a hora, o homem ainda precisaria evoluir mais para compreender esta nova revelaçao.

    De repente, me deu um estalo e eu pensei: cè qualcosa que non va. É que, para Steiner, Cristo é Deus mas também é uma entidade, um guia da evolução do homem; e Sua passagem pela Terra O teria ajudado a evoluir. Aí, eu achei demais: "Evolução, cara-pálida? Mas Ele é Deus! E Deus evolui?!"

     É claro que não foi só a minha 'exuberante e prodigiosa' capacidade intelectual que me fez compreender quem era verdadeiramente Jesus Cristo. Foi o coração que compreendeu, foi o Espírito Santo que agiu. Santo Agostinho, repetindo o salmista, escreveu " Com certeza, louvarão o Senhor os que o buscam, porque os que o buscam o encontram".

    Quando ficou claro para mim que Steiner era uma grande bazófia, lembrei-me do Pequeno Príncipe, de Saint-Exupéry, que dizia ser a linguagem uma fonte de mal-entendidos. E é verdade. Muito do que nos confunde nestes livros esotéricos são as expressões "mundos espirituais", "esferas superiores", "dimensões supra-sensíveis". 
   
    Automaticamente, nós relacionamos estes termos às coisas de Deus e dos anjos. Mas, na verdade, este é apenas o outro lado do mundo físico, sensorial e, neste outro mundo, também vivem os espíritos que "non provengono da Dio, nonostante venga utilizzato quasi sempre un linguaggio damore e di luce" ('espíritos que não procedem de Deus, ainda que seja utilizada quase sempre uma linguagem de amor e de luz'), nas palavras de um texto do Vaticano.

    E foi assim que, através de uma heresia gnóstica como a Antroposofia, eu acabei sendo levada a redescobrir Deus!

     Completamente apaixonada por Jesus Cristo, eu quis conhecê-lo. Precisava compreender para crer e crer para compreender. Para isto, fui atrás Dele no lugar certo: a Igreja Católica. Escrevi, brincando, num email  para meus irmãos:
     "Não adianta: quem entende de Deus e Jesus Cristo é a Igreja Católica. É perda de tempo ficar lendo steiners, sitchins e  blavatskis. Melhor bater na porta da firma que tem o direito de texto e imagem e é proprietária da logomarca dos dois. Afinal de contas, a empresa existe há dois mil anos, sem fechar as portas um dia sequer!" A primeira providência foi ler inteiro o documento 'Dominus Iesus'. Lá estava a confirmação da fé.

    Pode parecer, contando assim, que acreditar em Deus, para mim, é mero exercício intelectual. Mas o coração sabe que não é. Mesmo quando ainda não tinha voltado a crer, eu gostava sempre de repetir uma frase que ouvi de Leonel Brizola, quando lhe perguntaram, certa vez, se acreditava em Deus. Ele respondeu que era arrogância não acreditar em Deus. Hoje, penso que, se não temos a pureza de coração para simplesmente crer, a razão acabará por nos levar inexoravelmente à Verdade.

    Como me parece hoje absurdo não crer! Para mim, é impossível alguém conhecer a Verdade e não se deixar comover pelo amor de Deus por sua criatura nem se maravilhar com a perfeição e sabedoria do plano divino! Como pude viver tanto tempo sem a amizade de Deus!

    Acho que o momento definitivo da minha volta para Deus foi aquele em que ouvi pela televisão o anúncio da morte do Papa Woytila; profundamente comovida e chorando, disse para o meu marido: "Este homem está há 25 anos tomando conta de nós". Falo sempre que a minha conversão foi o último milagre de João Paulo II.

    Ainda durante o conclave, comecei a conhecer o pensamento e a atuação do cardeal Ratzinger, e torci para que ele fosse o novo Papa. Nunca vou esquecer as suas primeiras palavras já escolhido para ser o sucessor de Pedro: "sono un semplice e umile lavoratore della vigna del Signore"('sou um simples humilde e trabalhador da vinha do Senhor'). 
    
    São Bento será, com certeza, o meu santo protetor, pois, além de ser o nome do novo papa, a minha primeira confissão e comunhão, depois de quase 40 anos de escuridão, eu fiz na Paróquia São Bento do Morumbi,  onde moro. Que Deus ajude o Papa Bento XVI a recuperar a Igreja eterna que tantas deformações tem sofrido nos últimos anos. Que minha família O (re)encontre e que Ele nos abençõe a todos.

     *Este texto integral foi publicado, pela primeira vez,  no site católico Associação Cultural Montfort, em outubro de 2005. Mais tarde, eu o reescrevi recompondo a verdade.http://www.montfort.org.br/index.php?secao=cartas&subsecao=apoio&artigo=20051015183526&lang=bra


12 comentários:

  1. Mirian, é uma bênção para todos nós este seu testemunho. Veja só, também eu sou convertida, de atéia à cristã, e foi mais ou menos trilhando o seu caminho - não de escritora ou engajada na política - mas das buscas através das mais variadas religiões, especialmente no esoterismo. Também li "Eram os deuses...", curti o rock pauleira (sou guitarrista) e até na Ordem Rosa Cruz eu estive.
    Quando entrei na Igreja Católica, pensei mais ou menos como você: fazia lógica. Por mais que a prática dos católicos não me convencesse, toda a história desses 2 mil anos tinha lógica, e eu já tinha lido várias traduções da Bíblia, as Encíclicas, Cartas, Documentos, Patrística, Santo Tomás, Santo Agostinho... e tudo aquilo tinha muita lógica. Entretanto, entrei na Igreja sem fé em nada, nem em Jesus Cristo, sacramentos, nada, mas apenas para ver in loco como eram as coisas por dentro, para constatar se "batia" com o que eu imaginava. Todo aquele conjunto de informações que eu chamava de "Igreja" estava contido apenas no meu intelecto, sem qualquer paixão. Entrei assim mesmo, com o consentimento dos padres, e fui ficando... ficando... e já vai para 20 anos que estou na Igreja, graças a Deus!
    Muito obrigada pelo seu testemunho! Se me permite, gostaria de transcrevê-lo em meu blog, posso?

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  2. Raquel, grata pelas palavras generosas. Este depoimento nem é mais meu, sou apenas instrumento nas mãos de Deus. Claro que tu podes divulgá-lo.

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  3. Tenho certeza que a sua conversão foi o primeiro de muitos milagres que o Beato JPII fez e fará pela humanidade....lindas palavras e linda lição de vida..que Deus a abençoe a cada dia desta conversão e que ela sirva pra converter muitos corações !!!

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  4. Eu sou protestante (presbiteriano), que tem um profundo respeito e admiração por essa instituição milenar que é a Igreja Romana.

    Fico feliz de ler o seu testemunho.

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  5. Eu ainda tenho um longo caminho a percorrer, mas estou flertando com a Igreja Católica. Fica do seu testemunho dicas para futuras descobertas.

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  6. Míriam

    Obrigado! Sabe, eu demorei muito para admitir o que eu sou. Eu sou Ateu! Sempre fui. Desde meus primeiros raciocínios até hoje, não tem um dia de minha vida, que eu não me pergunte, não me questione e não veja minha fé, ser esmigalhada e usurpara do meu coração.

    Mas sabe, não sei se você conhece o Teatro Mágico, a Música: Cuida de Mim. Então, esta é a música que eu vivo.

    "Cuida de mim enquanto não me esqueço de você
    Cuida de mim enquanto finjo, enquanto finjo, enquanto fujo."

    Eu vivo a minha "mentira de cada dia"!

    Sou assíduo debatedor na internet, debato com ateus, principalmente! E muitas vezes, acabo vendo com alegria que alguns, encontram o que eu nunca encontrei.

    Sou o maior hipócrita que eu conheço... eu vivo e prego, mas não creio. Minto pra mim todos os dias. Já li a conversão de Patrick Glynn, o lindo caminho de Antony Flew e a brilhante dissertação de Norman Geisler e Frank Turek: "Não tenho fé suficiente para ser ateu".

    Graças a Deus, Nosso Senhor Jesus Cristo e a intercessão de Nossa Senhora, tenho a Igreja para me ajudar.

    Amo a Igreja, me tornei Católico aos 20 anos, quando uma protestante me disse que eu não era católico por que não tinha a primeira comunhão... então, dali em diante, não parei, comunhão, casamento, crisma, catequista, missionário, educador. Hoje vivo em Moçambique com minha família... Minhas linda esposa e minha família feliz. Como é bom ver minhas filhas rezando com fé... uma fé, que nunca tive e nem sei se terei um dia.

    Tenho medo da morte... não da morte em si! Mas da tentação que terei... convivo com ela todos os dias. Faço tudo pela Fé, ou melhor, pela fé que eu queria ter! Me identifico muito com Madre Teresa, que vivia num deserto segundo suas próprias palavras.

    E ler seu testemunho... aliviou um pouco... esta noite, terei mais um argumento para combater minha tentação, meu raciocínio, minha inteligência... Agradeço a Deus por ela, mas eu teria mais Paz, se não a tivesse, não... não a trocaria por nada, não pense que sou um bitolado! Mas quem não gostaria de viver sem tentações?

    Se ainda fosse um olho, ou minhas mãos, eu poderia arrancá-los... mas é minha mente, está em mim.

    Eu choro... Todos os dias! E agradeço a Deus por isso, pois me consola que a dor nos aproxima do Senhor.

    Amo comungar! Amo cada segundo da Santa Missa.

    Suas palavras, me ajudaram! Saiba disso! Você leu tudo o que leu, fez tudo o que fez, para que eu, ou pessoas como eu, não precisassem fazê-lo. Suas palavras, seus verbos... mostram-me o Verbo de Deus nas entrelinhas.

    Estou rezando por você. Reze por mim.

    Paz e bem

    Nithapele

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  7. Nithapele, eu tenho certa dificuldade para imaginar a emoção que muitos dizem sentir ao ler o que eu escrevi. Eu simplesmente escrevi a minha história, foi saindo, à medida que eu (re)lembrava a minha vida e o caminho que eu percorri. Ao ler teu post, eu compreendi um pouco desta emoção. Tuas palavras tocaram-me profundamente. Elas dizem coisas iguais às que eu sinto e penso. Eu também tenho medo desta fé 'só cérebro'. às vezes, quase me desespero achando que, de verdade mesmo, eu não sinto Deus, mas que é a idéia maravilhosa de Deus que me seduz. Mas, em seguida, eu vejo (vejo, sim) a presença 'física' Dele em minha vida, a cada momento. E então, eu creio.

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  8. Obrigada, Mirian pelas suas palavras. Eu, ao contrário de vocês intelectuais, não tenho essa cultura acadêmica. Mal sei autores e suas ideologias, conheço apenas de ouvir falar. Tenho, porém, empatia pelas pessoas, mas essa empatia nada mais é o Espírito Santo agindo. Sinto-me feliz por compreender e viver aquilo que todos os seres humanos anseiam: Deus. Eu não sei falar de forma erudita sobre Deus, mas sinto-O. Minha avó já está com 80 anos e não perde a alegria de nos falar sobre Jesus. "de tudo o que vivi na minha vida, deixo para vocês o melhor, que é Jesus. E não julguem. Devemos pois apenas orar para que todos alcancem o arrependimento. Deus tem o tempo certo para cada pessoa". Graças a Deus por tudo, sempre. Se você atravessou um deserto de cerca de 40 anos até se encontrar com Jesus é porque Deus o quis assim. Você e seu depoimento é o que muitos intelectuais precisam para se tornarem humildes, e tentarem um olhar não científico da vida, pois você com toda sua bagagem e referência social é o que ajudará na conversão de muitos pseudos 'donos da verdade'. Que a paz do Senhor, que excede todo entendimento, esteja com você sempre. :)

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  9. Posso dizer que seu texto foi um grande presente de natal para todos os leitores. Apesar de você reconhecer-se como amadora no ofício de ensinar ("Ide e ensinai"), acredito que acabou ensinando muito pra muita gente. Obrigado!

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  10. Míriam,
    recebi hoje à noite de um amigo católico, residente nos EUA, ministro do Santo Rosário de Fátima, uma mensagem indicando o link de seu testemunho de conversão. Meu amigo acompanhou os últimos momentos da gigantesca batalha que enfrentei para retornar à Santa Igreja - e que teve sua glória ante-ontem, 21 de Dezembro de 2011!: Eu e meu marido, após 14 anos de casamento, marcado por passagens por seitas maçônicas, impregnado pelo modernismo, comunismo e muito mais, fomos finalmente abençoados por Deus em uma celebração repleta por sinais incríveis de Deus! Querida, até o lugar onde realizamos nossa íntima comemoração com nossa família Ele escolheu: o lugar que marcou o princípio do envenamento espiritual em nossas vidas...
    Fico muito feliz de ler o seu relato neste momento tão especial de minha conversão. Compreendo o heroísmo de sua iniciativa, pois como você, também pertenço a este setor "comunicações" e me entristeço profundamente pela consciência que hoje possuo do mal que corrói nossa nação e espreita nossas crianças. Também morei em BSB durante o período do Collor, participei de "elaborações" com o Governo Lula, enfim, é reconfortante saber que não estou sozinha nesta luta que ainda teremos muito o que enfrentar.
    Míriam, gostaria de te conhecer e compartilhar com você uma iniciativa que estou envolvida em relação à defesa da liberdade de expressão. Porfavor, não publique minha mensagem em seu blog, pois tenho muitos receios quanto à retaliações que você sabe o quão perigosas podem ser. Meus filhos ainda são pequenos e sou sócia de uma produtora no rio que atende ao mercado publicitário. Vou deixar meu email pessoal para que você possa entrar em contato quando quiser!
    Querida irmã, Feliz Natal, que a Fé que anima a Santa Igreja aqueça seu coração com Seu vigor Santo e libertador!
    Com carinho,
    Adriana Poggi.
    dricapoggi@yahoo.com.br

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  11. Faltou ler sobre a historia da igreja católica....e suas Heresias.....

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  12. Boa noite Miriam! Ao assistir as aulas de Orlando e Ivone Fedeli tive conhecimento do seu testemunho, tanto que li, reli e salvei nos meus documentos. Dou-lhe parabéns pelo seu desnudamentos, apesar de acreditar que o seu caminho lhe fez mais sábia. Eu acredito que a fé tem que passar pela razão, pela consciência, caso contrário ela se torna vulnerável a acontecimentos futuros. Parabéns! Com certeza irei mostrar o seu depoimento aos meus dois filhos Rosalba Amália e Abner Georgos.

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